1.2.11

AROEIRA COMO POTENCIAL PARA USOS MÚLTIPLOS NA PROPRIEDADE RURAL



Amilton João Baggio
*
RESUMO

A identificação e a descrição de espécies arbóreas para usos múltiplos fornece
subsídios para o desenvolvimento de sistemas integrados de produção, onde a
espécie florestal atua como elemento básico para a amenização ambiental (ciclo
hidrológico, movimentos do ar, temperaturas extremas, ciclagem de nutrientes etc.) e
diversificação de produção (produtos e subprodutos florestais). Nesse sentido, são
apresentados dados sobre a aroeira  (Schinus terebinthifolius Raddi) que permitem
indicá-la como potencial para associações agroflorestais. A espécie ocorre em quase
todo o território brasileiro e presta-se aos usos como lenha, carvão, moirões, cercas
vivas, forragem para cabras, aves silvestres e abelhas, ornamentação, medicina
doméstica, arborização de pastos e recuperação de áreas degradadas, entre outros.
É apresentada uma revisão de literatura e experiências de agricultores.


1. INTRODUÇÃO
A escassez de informações sobre espécies florestais nativas para usos
múltiplos nas propriedades rurais, assim como a ausência de difusão dos
conhecimentos existentes, faz com que muitas essências valiosas sejam
subutilizadas. Entre elas, estão a bracatinga (Mimosa scabrella) no Estado do

Paraná e acácia-negra (Acacia mearnsii), no Estado do Rio Grande do Sul, que,
apesar da existência de extensas plantações, seus potenciais de uso não são
integralmente aproveitados.
A aroeira (Schinus terebinthifolius  Raddi), apesar de ser conhecida no meio
rural, não é ainda utilizada em sistemas integrados de produção, principalmente
pelos pequenos e médios produtores. Esta essência florestal possui atributos
importantes para usos múltiplos como os de muitas outras espécies conhecidas
mundialmente.
Este trabalho oferece uma descrição da espécie, apresentando uma revisão de
literatura, observações de campo e resultados práticos de pesquisa.


2. DESCRIÇÃO GERAL
A aroeira pertence à família Anacardiaceae e possui outros nomes comuns
como: aroeira-vermelha, aroeira-mansa, aroeira-branca, aroeira-da-praia, aroeira-dosertão, aroeira-do-paraná, araguaraiba, corneiba, fruto-de-sabiá e árvore-da-pimenta.
Outras espécies desta família, que também são conhecidas por aroeira, são: Schinus
molle, Astronium urundeuva e Lithraea brasiliensis.
De grande plasticidade ecológica, a aroeira ocorre desde o Nordeste
(PARENTE & QUEIRÓS, 1970; LIMA, 1954; CORREIA, 1926), passando pelos
cerrados (RIZZINI, 1970), chegando ao Rio Grande do Sul (INOUE, et al. 1983) e
estendendo-se à Argentina e Paraguai (MATOS, 1965). A espécie é encontrada
desde a planície costeira até altitudes de 1.100 m a 1.200 m
*
A aroeira foi .
introduzida também em diversos países da Europa, África, América Central e Ásia
para fins ornamentais.
Dentro de sua amplitude ambiental, a espécie apresenta distintas formas de
crescimento, com ecótipos de porte variando desde pequenos arbustos (50 a 60 cm
em altura) até árvores com 15 metros e diâmetros de 50 a 60 cm (REITZ et al. 1983).
BARKLEY (1957) na revisão do gênero  Schinus, reconhece quatro variedades,
distintas pela pubescência dos ramos e folhas, pelo número de folíolos e ápice dos
mesmos. Blackwell & Dodson (1968), citados por PIRANI (1981), acreditam, no
entanto, que todas as variedades propostas para a espécie devem representar
diferentes pontos de uma variação intra-específica contínua para os caracteres de
folha e indumento, questionando essa divisão.
O fuste é geralmente curto e tortuoso, sustentando uma copa arredondada,
pouco densa e atraente, principalmente quando da floração (pequenos cachos de
flores brancas) e frutificação (cachos de frutos globulosos, vermelhos) REITZ, et al.
1983). As folhas compostas, alternadas, imparipinadas, com 3 a 10 pares de folíolos,
têm, como detalhe principal, pecíolo alado típico (REITZ, et al. 1983; SANCHOTENE,
1985).
A propagação dá-se por sementes e, certamente, por estaquia a partir de
segmentos da raiz e do caule. O crescimento é relativamente rápido, podendo atingir
1,0 m de altura no primeiro ano (SANCHOTENE, 1985).
Em experimento implantado em Irati-PR, ela atingiu 3,25 m em altura média aos
cinco anos de idade, com alta sobrevivência (93,8%) e resistência à geada
(CARVALHO 1981). No entanto, em Paranaguá-PR, o autor registrou crescimento
superior, atingindo, já no primeiro ano de idade, a altura média de 3,31 metros, com

90,5% de sobrevivência. Em experimento implantado em Dois Vizinhos, sudoeste
paranaense, SILVA & REICHMANN NETO (1986) obtiveram entre 7,9 m e 8,9 m de
altura média aos 10 anos de idade, com 100% de sobrevivência. A sua alta
plasticidade ecológica sugere a seleção do material mais desejável para cada sítio
específico.

3. USOS
3.1. Madeira e Energia.
A madeira da aroeira é resistente, podendo ser utilizada como esteios e
mourões, devido à sua durabilidade prolongada (REITZ, et al. 1978, SANCHOTENE,
1985). A lenha desta espécie é de boa qualidade, sendo muito procurada no meio
rural. Em análise feita pelo laboratório do CNPF/EMBRAPA, foram obtidos os
seguintes resultados:
Embora a literatura cite a madeira de aroeira como de alta densidade, não
foram encontrados dados numéricos publicados sobre esta variável. Nas análises
efetuadas, foi detectada uma densidade média, porém com características
energéticas, comparáveis às de espécies como a bracatinga e alguns eucaliptos
tradicionalmente utilizados para esse fim. Não existem reflorestamentos energéticos
com a aroeira. No entanto, ela é aproveitada na exploração de matas naturais e
muito procurada para usos domésticos, nas propriedades rurais e no pequeno
comércio. Assim, ela poderá assumir papel importante como fonte energética nos
sistemas integrados de produção, se for devidamente manejada para usos múltiplos.

3.2. Forragem para abelhas.
*
A aroeira é uma espécie de valor apícola para a produção de mel de qualidade
e pólen. Com período de floração prolongado, estendendo-se desde outubro até abril
(REITZ et al. 1983), parece haver preferência das abelhas pelas suas flores brancas
e pequenas (que se reunem em densos e grandes cachos terminais vistosos), devido
à frequência regular de visitação, principalmente quando outras espécies não estão
em floração. CARVALHO (1987) observou que a aroeira floresce a partir de três
meses de idade, podendo proporcionar receitas precoces ao apicultor.
Recomenda-se ao apicultor o plantio de todas as variedades desta espécie
existentes na região, pois seus períodos de floração são distintos.


3.3. Forragem para cabras.
Nas proximidades de Curitiba, Sul do Paraná, é comum o uso da aroeira como
suplemento alimentar para caprinos. Esses animais comem avidamente as folhas e
brotos desta espécie. A boa palatabilidade e disponibilidade desta forragem, mesmo
em épocas críticas, estimulou um programa de fomento e plantio entre os associados
da Cooperativa dos Caprinocultores do Paraná (CAPRIPAR). A análise
bromatológica de uma amostra de folhas dessa espécie, efetuada pelo Instituto
Tecnológico do Paraná (TECPAR), apresentou os seguintes resultados.
Pelo valor da digestibilidade in vitro da matéria seca, da ordem de 33%,
determinado pelo Centro Nacional de Pesquisa (CNPC), considera-se a forragem da
aroeira como razoável. A presença de taninos (CORREIA 1926), que limita o seu uso
para outros animais, parece não ser limitante para as cabras, conforme informações
dos produtores. No entanto, pesquisas devem ser desenvolvidas para avaliar o seu
efeito ao longo do tempo


3.4. Cercas vivas.
A utilização de palanques vivos (árvores) para fixação de arame é pouco
comum no Brasil, ao contrário de muitos países, especialmente dos trópicos.
Para a formação de cercas vivas, embora não seja requisito indispensável, são
preferidas espécies que se propagam vegetativamente, por estacas de grande
tamanho, o que viabiliza a utilização precoce da planta, como palanque vivo. Nesse
caso, o arame pode ser fixado assim que a estaca enraize, o que leva de 3 a 6
meses, dependendo da espécie. Outro atributo recomendável é que as espécies
possuam potencial para utilização múltipla e rebrotem, permitindo a exploração
periódica da copa.
A aroeira apresenta estas características desejáveis (SANCHOTENE, 1985). No
meio rural, encontram-se árvores antigas que se estendem a partir de estacas
enterradas como moirões. A aroeira é uma espécie muito utilizada para esse fim,
devido à sua longa durabilidade no solo. Também constatou-se que nem todas essas
estacas lenhosas enraizam, evidenciando a necessidade de estudos para este tipo
de propagação.


3.5. Ornamentação.
Pela beleza de sua folhagem (perene, de cor verde a verde escuro, com brotos
jovens avermelhados), da sua floração (prolongada) e frutificação (persistente), a
aroeira é recomendada e utilizada como ornamental, principalmente em praças e
parques municipais. Ela foi introduzida na Europa e Estados Unidos para esta
finalidade. Esta espécie foi adotada na arborização de parques e avenidas de quase
todas as cidades e núcleos de população da Côte D'Azur e da Riviera Liguriana
(CORREIA, 1926). Na área rural, o melhoramento da paisagem contribui para a
valorização da propriedade.

3.6. Medicinal.
São atribuídas inúmeras qualidades medicinais à aroeira, restringindo-se o seu
uso, no entanto, ao nível doméstico. Em Cuba, onde foi introduzida e recebeu o
nome de copal, ela é usada como susbstituta do verdadeiro copal (Protium cubense)
do qual se extrai uma resina terebintácea para uso em compressas (ROIG & MESA,
1945).
BALBACHAS (1959) recomenda o chá das cascas (100 g/l de água) para curar
diarréias e hemoptises. Ela é utilizada também em banhos, com 25 g/litro de água,
contra a ciática, a gôta, o reumatismo, e bactérias que se manifestam sob a forma de
edemas do tipo erisipela.
CORREIA (1926-1978) descreve as propriedades da casca observando seus
efeitos depurativos, febrífugos e contra afecções uterinas em geral. As folhas,
segundo esse autor, são anti-reumáticas e valioso remédio na cura de úlceras e
feridas. Aos frutos, atribui-lhes propriedades diuréticas e recomenda, ainda,
precaução no uso da planta, devido às suas propriedades tóxicas, apesar de não
haver dúvidas quanto às suas qualidades anti-nevrálgicas, adstringentes, tônica e
estimulante.

3.7. Arborização de pastos.
A aroeira vegeta naturalmente em algumas áreas de pastagens, não sendo
consumida nem assediada pelo gado. Ela pode ser plantada, com mudas gigantes
ou estacas,  sob proteção para fins de sombreamento aos animais. Ela apresenta as
vantagens de ser perenifólia e de se adaptar a condições adversas (rusticidade),
apresentando bom pegamento.


3.8. Outras propriedades.
Fazendo jus a um dos seus nomes vulgares (fruto-de-sabiá), a aroeira é uma
das espécies mais procuradas pela avifauna em nosso meio (SANCHOTE, 1985).
Outra qualidade dessa espécie é a sua capacidade de ocupação de áreas
degradadas. O pioneirismo e a agressividade da aroeira permitem o seu
estabelecimento em habitats tão adversos como a caatinga. Ela desenvolve raiz
pivotante e profunda, merecendo estudos quanto à ciclagem de nutrientes e
enriquecimento do solo.
Como fator negativo, a sua alta capacidade reprodutiva torna-a agressiva na
invasão de áreas onde a sua presença não é desejável. Recomenda-se, portanto,

cautela no planejamento e manejo dos seus plantios, principalmente fora de sua
região de origem. Embora, no Brasil, não se caracterize como tal, ocorrendo em
proporções equilibradas na flora nativa, a aroeira introduzida na Flórida tornou-se
invasora (SANCHOTENE, 1985). Outras qualidades indesejáveis são suas
propriedades alergênicas para pessoas sensíveis, ocasionando lesões e edemas.
Ela é tida como tóxica também para o gado bovino (CORREIA, 1926).
A aroeira é, também, resistente ao fogo, como foi constatado na região do
cerrado, em exemplares que já resistiram a vários incêndios. Devido à sua
capacidade de rebrota, a espécie pode ser utilizada em barreiras contra incêndios,
desde que seja manejada em forma arbustiva.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os dados e informações apresentados neste trabalho são incompletos, porém
indicativos do potencial da espécie. Assim, parece importante o desenvolvimento de
pesquisas para a melhoria qualitativa e quantitativa dos produtos e serviços que ela
pode oferecer. Prioritariamente, recomenda-se o estudo dos aspectos relativos à
propagação por estacas (épocas de corte, dimensões das estacas, seleção do
material), apicultura (produção e qualidade de néctar e pólen), manejo de plantios em
sistemas agroflorestais (espaçamentos, podas), botânica (floração, ecótipos,
habitats), produtividade de lenha, entre outros.


5. REFERÊNCIAS
ALCÂNTARA, P.B. & BUFARAH, G. Plantas forrageiras: gramíneas e leguminosas.
São Paulo, 1982. 150p.
BALBACHAS, A. As plantas curam. São Paulo, Missionária, 1959, 431p.
BARKLEY, F.A. A study of Schinus Lilloa. 28:5-110. 1957
BORBA, D.F.  Contribuição ao estudo do gênero Schinus L. no estado de São Paulo.
Loesgrenia (69):1-8, 1976.
CARVALHO, P.E.R. Competição entre espécies florestais nativas em Irati-PR, cinco
anos após o plantio. Boletim de Pesquisa Florestal, (02):41-45, 1981.
CORREA, M.P. Dicionário das plantas úteis do Brasil e das exóticas cultivadas.
Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1926-1978. v.1. 747p.
INOUE, M.T..; RODERJAN, C.V. & KUNIYOSHI, S.Y. Projeto madeira do Paraná.
Curitiba, FUPEF, 1984. 260p.
LIMA D.A. Contribution to the study of the flora of Pernambuco, Brazil. Recife,
Universidade Rural de Pernambuco, 1954. 154p. (Monografia 1).
MATTOS, J.R. Flora do Rio Grande do Sul. São Paulo. Instituto de Botânica, 1965.
110p.
PARENTE, E. & QUEIRÓS, Z.P. Essências florestais das Serras do Ceará. Brasil
Florestal, 1 (4):30-6, 1970.Boletim de Pesquisa Florestal, Colombo, n. 17, p.25-32, dez. 1988.
PIRANI, J.R. Flora fanerogâmica da reserva do Parque Estadual das Fontes do
Ipiranga. Anacardiaceae. HOEHNEA, 9:108-110. 1981.
REITZ, R.; KLEIN, R.M. & REIS, A.  projeto madeira de Santa Catarina. Itajaí,
Herbário Barbosa Rodrigues, 1978. 320p.
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RIZZINI, C.T. Árvores e arbustos de cerrado. Rodriguésia, 26, (38):63:77, 1970.
ROIG & MESA, J.T. Plantas medicinales, aromáticas o venenosas de Cuba.
Havana, Cultura, 1945. 872p.
SANCHOTENE, M.C.C. Frutíferas nativas úteis à fauna na arborização urbana.
Porto Alegre, Feplan,1985. 311p.
SILVA, L.B.X. & NETO, F.R. Avaliação do comportamento de 18 essências florestais
aos 10 anos de implantação. In: CONGRESSO FLORESTAL BRASILEIRO, 5.,
Recife, 1986. Anais. Silvicultura, (41):101-4, 1986.

Pegoraro, A. Professor de Apicultura-UFPR. Informação pessoal.
Boletim de Pesquisa Florestal, Colombo, n. 17, p.25-32, dez. 1988.











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